segunda-feira, 1 de abril de 2013

Tolerância



Maria Regina Camarano
            A tolerância é a capacidade de a pessoa aceitar, nos outros, maneiras de pensar, sentir e agir distintas ou totalmente opostas às adotadas por si mesma. Para ampliar o tratamento do tema em questão, essa definição pode ser também aplicada para se referir à tolerância entre povos e nações.
            Sob a ótica da Cosmoeticologia, especialidade da Conscienciologia para o estudo da ética cósmica ou multidimensional, a tolerância pessoal ou grupal tem como limite inteligente a compreensão e aceitação do outro, sem, no entanto, se acumpliciar com as ações contrárias à moral cósmica, ou seja, aos princípios mais amplos, universais e multidimensionais que regem o comportamento individual e do grupo, além daqueles sustentados socialmente pelas disposições legais ou pelas práticas aceitas em determinada sociedade.
            Para não se acumpliciar com os comportamentos contrários à moral cósmica, torna-se necessário, sobretudo, o discernimento ou juízo crítico para compreender as situações ou fatos de forma clara, com o intuito de distinguir o certo do errado, o falso do verdadeiro ou, conforme se diz popularmente, separar o joio do trigo.
            A falta de discernimento pode resultar na tolerância anticosmoética, que gera a interprisão grupocármica – o comprometimento com o grupo, em função da realização de ações errôneas conjuntas ou da conivência por aceitar tais ações. Exemplos de tolerância anticosmoética são fatos como: acobertamento da Igreja Católica aos padres pedófilos; profissionais que defendem os criminosos sabendo das ações errôneas cometidas, porém buscando provar a inocência dessas pessoas; dentre outros.
            Entretanto, para se entender o sentimento de intolerância em relação ao outro, modificar o comportamento para se tornar um indivíduo ou grupo capaz de aceitar e compreender as diferenças, é importante perceber como se manifestam os comportamentos intolerantes.
            A história da humanidade tem sido marcada pela falta de tolerância entre povos e nações, originando as hostilidades e os conflitos armados. As diferenças sociais, econômicas, religiosas e, consequentemente, culturais, quando não compreendidas, por falta de cosmovisão e do comportamento bélico ainda arraigado na grande maioria da humanidade, pode ter como consequência a falta de tolerância.
            Na Antiguidade, um exemplo de intolerância religiosa foi a perseguição dos primeiros cristãos pelos judeus e pagãos. Posteriormente, os cristãos usaram métodos semelhantes contra seus antigos perseguidores. O longo conflito do Oriente Médio, envolvendo árabes e judeus, que teve início no final do século XIX, se estende até os dias de hoje. Durante o século XX, no período da 2ª Guerra Mundial, conflito originado pelo conjunto de diversos fatores, os nazistas eliminaram judeus e outras etnias indesejadas pelo regime.
            A intolerância tende a assumir diversas formas, podendo, portanto, ser analisada sob diferentes perspectivas: religiosa, social, política, ideológica, étnica, sexual, generacional (discriminação por idade). Normalmente, a falta de tolerância social, religiosa, étnica e sexual tem por base o preconceito, isto é, a opinião pessoal ou sentimento formado sem o uso da racionalidade, da ponderação, do juízo crítico. O preconceito, em geral, é resultado da inculcação do conjunto de valores impostos socialmente e aceitos pela maioria das pessoas por falta de juízo crítico, de autonomia da pessoa para pensar por si mesma. Assim, todas as ideias, os sentimentos e comportamentos que fogem aos padrões sociais vigentes passam a não ser aceitos.
            A hipótese explicativa da aceitação do conjunto de valores sociais pela maioria das pessoas, sem questionamento desses valores, pode ser fundamentada na teoria do pensene, proposta pela Conscienciologia, neociência que estuda a consciência de maneira integral, manifestando-se em todas as dimensões.
            São 3 os componentes do pensene: ideia ou pensamento, o sentimento ou a emoção e a energia de cada pessoa ou do grupo, que atuam indissociavelmente em toda manifestação consciencial. O conjunto dos pensenes de uma determinada pessoa ou grupo dá origem ao holopensene pessoal ou grupal.
            Assim, é importante perceber a influência do holopensene do grupo ou da sociedade que, através das energias (o ene do pensene), reverbera sobre os pensenes pessoais e grupais, e, consequentemente, sobre os comportamentos, com tendência a cristalizá-los e reproduzi-los indefinidamente, caso não haja o movimento contrário de renovação de valores.
            É dessa forma que são adotados os valores vigentes na sociedade, sem questionamentos se são os melhores para todos os envolvidos, contrariando o princípio da ética cósmica (cosmoética) que propõe “que aconteça o melhor para todos”. É, também, a partir desse processo de reverberação dos pensenes que a intolerância pode assumir as proporções que conhecemos nos conflitos atuais. Na mesma condição, ao predominar o holopensene relacionado à tolerância, o mesmo poderá influenciar todo o grupo, povos e nações. Por exemplo, a aprovação pela Assembleia Geral da ONU da elevação do status palestino na entidade para “Estado observador não-membro”, situação que, embora tenha gerado descontentamento por parte de Israel e de seus aliados, poderá representar a abertura para o início de mudança, influenciando na renovação do holopensene da região. Outro exemplo são as legislações de países democráticos, favoráveis à convivência pacífica entre seus habitantes.
            Em geral, as mudanças têm início a partir de iniciativas pessoais ou de pequenos grupos que atingiram o nível de discernimento que lhes possibilita distinguir o que é melhor para todos. Segundo Waldo Vieira (Temas da Conscienciologia), a maxifraternidade (sentimento de afeição por todos os seres) há de ser compreendida antes, de modo individual (egocarma), pela conscin ou consciência intrafísica, a fim de ser compreendida depois, grupalmente (grupocarma), pela Socin ou sociedade intrafísica, que também tem o seu holopensene.
            Nesta perspectiva, é importante que cada pessoa se questione sobre a sua capacidade de aceitar, nos outros, maneiras de pensar, sentir e agir de forma distinta às adotadas por si mesma e quais os impedimentos ou “travões” presentes na sua forma de ser, no seu íntimo, que impedem a compreensão do outro e, consequentemente, a convivência pacífica. Os autoquestionamentos diários podem elucidar o nível de intolerância, que, na maioria das vezes, se encontra presente nos conflitos que ocorrem nas relações familiares, de vizinhança, de trabalho, dando origem ao desconforto e mal-estar entre os envolvidos.
            Algumas características do temperamento pessoal podem se tornar obstáculo ao exercício da tolerância como: orgulho, vaidade, arrogância, autoritarismo, competição, apego, submissão, egoísmo, além de outros. A autossuperação destes traços representará mudanças das ideias, sentimentos e comportamentos pessoais, repercutindo no holopensene pessoal e reverberando, também, no holopensene do grupo ao qual o indivíduo está mais próximo, sobretudo a partir do seu exemplo, da sua ação.
Maria Regina Camarano é voluntária do INTERCAMPI em Recife.

Fonte: Site da Intercampi, postada em 05/dezembro de 2012.
http://intercampi.org/2012/12/05/tolerancia/

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